DESCRIÇÃO

No arcano XV, do padrão Marselha, vemos a figura do Diabo ao centro, em pé, sobre um pedestal, ladeado por dois capetas. O Diabo apresenta, em sua aparência, uma mistura de características pertencentes a humanos e a animais – seus pés e mãos apresentam garras e suas orelhas são como de animais de rebanho. Apresenta também duas asas de morcego nas costas e os olhos vesgos.

Ele veste uma malha justa que cobre seu corpo da cintura ao tornozelo e destaca a sua genitália masculina. Em seu peitoral apresenta círculos que parecem mamas femininas. O Diabo parece vestir um elmo de onde surge um chifre de cada lado da cabeça. Além disso, ele segura com a mão esquerda uma barra de metal com ganchos na ponta e mostra a mão direita com o dorso para frente.

De um lado e do outro do pedestal, duas criaturas, aparentemente macho e fêmea, aparecem nuas com as mãos escondidas atrás das costas. Sobre a cabeça, que parece realçar um crânio alongado para trás, eles vestem apenas uma boina, de onde chifres parecem se fixar. Eles possuem o rabo, os pés e as orelhas como a dos animais. Ao redor do pescoço de cada um, um laço frouxo os une a uma argola fixada na base do pedestal.

ASSOCIAÇÕES

1) O pedestal:  estar acima dos demais representa o lugar de destaque ocupado por uma figura de autoridade. O Diabo personifica a mais alta hierarquia das trevas, o poderoso chefão do crime organizado numa versão extra, plus, ultra, super, mega power.

2) A haste com ganchos simboliza os instrumentos de tortura e a intenção de causar dor e sofrimento. Muitas vezes desejamos ver aqueles que nos causaram dor e sofrimento sofrerem também. Queremos que sintam a dor que sentimos e muito mais. Esse desejo pode ser motivado por vingança ou apenas pelo prazer sádico e cruel. Desejar a dor e o sofrimento de outra pessoa é uma característica do mal, assim como a maldade e o malefício. O mal sente prazer em semear a dor, o sofrimento e a destruição.

3) Os olhos vesgos, um em direção ao outro, simbolizam o egoísmo.  Retratam a capacidade de olhar, o tempo todo, para si mesmo. Esse comportamento além de deixar os outros fora do campo de visão e de importância, ainda afeta a clareza da autopercepção, adulterando a autoimagem e a importância que atribui a si mesmo.

4) A aparência bestial simboliza o grau de maturidade e de consciência ainda primitivos. Neste caso, as habilidades cognitivas estão a serviço dos apelos primitivos que exigem satisfação imediata sem levar em consideração a justiça. É comum vermos pessoas imaturas e cobradoras colocarem a vontade e a inteligência a serviço do atendimento dos seus desejos, instintos e necessidades em detrimento dos outros.

A aparência assustadora do Diabo representa também o resultado da intenção negativa que cobre com camadas fétidas de energia doente, podre e deformada, a fagulha de amor divino que constitui todo o ser da criação.

5) As asas de morcego representam a afinidade com as sombras e a escuridão.  

O morcego é um animal cego que tem hábitos noturnos. Enquanto os outros dormem, ele age. Os espíritos das sombras também costumam agir quando a gente não está vigilante, atento e desperto. Além disso, durante a noite, gozando de privacidade, longe dos ambientes públicos e dos afazeres do trabalho, algumas pessoas podem se permitir certos comportamentos nocivos e doentios que estão em sintonia com a baixa vibração energética do mal.

A energia vibra e a maior velocidade de sua vibração produz luz. No sentido contrário, a lentidão da vibração provocada pela estagnação e pela condensação do fluxo de energia vital produz a sombra. As trevas são o ambiente produzido pelos bloqueios ao livre fluxo da energia da vida atribuído ao mal.

A pouca luz da consciência primitiva não é suficiente para iluminar e integrar os conteúdos que se encontram no inconsciente. Assim, o inconsciente, muitas vezes é chamado de sombra. Isso não quer dizer que tudo o que se encontra no inconsciente está relacionado ao mal. No inconsciente há também potenciais e qualidades positivas que aguardam para serem integrados à consciência.

6) A sexualidade do diabo: durante séculos, a sexualidade esteve associada ao pecado. Isso porque, nos primórdios da história, a selvageria humana era expressa livremente, inclusive sexualmente. Mais tarde, com um pouco mais de civilização, a autorrepressão levou para o inconsciente os impulsos destrutivos. Acontece, porém, que a energia sexual traz à tona a negatividade que se encontra reprimida. Assim, a culpa inconsciente, por exemplo, pode aparecer como um desejo de sofrer ou ser humilhado na relação sexual.

Muitas pessoas reprimem inconscientemente o impulso sexual como forma de conter a negatividade que busca se expressar. Ao mesmo tempo, sem saber desse movimento inconsciente, a pessoa pode usar de artifícios para despertar o desejo sexual enfraquecido, isso pode agravar ainda mais o problema. A vida sexual pode oferecer pistas de limitações emocionais, conclusões equivocadas e questões espirituais que obstruem a plenitude da vida. Saber lidar com isso de maneira adequada pode ser bastante produtivo.

7) Os pequenos demônios:  em número de dois, macho e fêmea aparecem com as mãos escondidas atrás das costas. Não sabemos se estão amarradas ou apenas ocultas. As mãos ocultas simbolizam os atos desonestos que são praticados pelo mal, geralmente às escondidas.  

A negação da vida espiritual, da existência dos “anjos” e dos “demônios” ajuda O Diabo a manter-se escondido e assim, agir sem ser percebido. Ao contrário, reconhecer a atuação de forças negativas que interferem na vida cotidiana, com a intenção de prejudicar, controlar e obter poder deixa-nos mais atentos e menos vulneráveis e colaborativos com o governo oculto do mundo e seus propósitos.

  1. As cordas que envolvem seus pescoços simbolizam a submissão de ambos ao mal. Os laços que prendem os capetas estão ligados ao pedestal. Isso significa dizer que a submissão se dá com a hierarquia e não com o indivíduo. A corrente que envolve o pescoço não está apertada a ponto de impedir que seja retirada com as próprias mãos, caso estejam soltas. Aceitar a submissão é um tipo de prisão na qual a vontade do “prisioneiro” foi corrompida. Os pequenos capetas escolheram servir ao mal, aceitaram os acordos com o mal, acreditaram em suas promessas e se comprometeram com ele. A partir desse compromisso suas naturezas interiores foram gradualmente alteradas, assim como suas aparências que se adaptaram ao novo estado de consciência e criações bestiais.
  • As orelhas de burro que ambos apresentam simbolizam o embotamento da mente. O aprisionamento pelo mal causa um entorpecimento do raciocínio. Esse fenômeno de enevoamento dos pensamentos dificulta o questionamento, a reflexão e a busca de soluções para se fugir do confinamento e da submissão. A vontade fica limitada pela incapacidade de pensar com clareza. Essa confusão mental é produzida para ser usada como um instrumento de dominação sobre aquele que está sujeito à hierarquias sombrias superiores.
  • As mamas do diabo: o seio materno simboliza o alimento e o contato da mãe nutridora com seu bebê. Uma das funções principais da mãe é proteger e nutrir seu filho.  Algumas facções criminosas oferecem alguma nutrição e proteção para seus membros. Essa caricatura de uma verdadeira proteção e nutrição aparece representada nas mamas desenhadas no peito do diabo. Apesar de todas as suas promessas de sucesso e riqueza, o diabo não pode dar o verdadeiro alimento da alma, que é o amor.  Essa substituição do amor por sucesso, riqueza, fama e poder passageiros e mundanos não alimentam verdadeiramente a alma e por isso não cessam a fome interior.
  • O elmo com chifres: o Diabo e seus súditos vestem cada um, sobre a cabeça, uma cobertura na qual um par de chifres está afixado.  Esses chifres não fazem parte de seus corpos. São um adereço, uma uniformização que representa a falange a que são vinculados. Os chifres também simbolizam um desejo de proximidade e identificação com o poder masculino dos machos dominantes dos rebanhos. Ser o macho alfa, o dominador, aquele que se destaca entre os demais membros do grupo, demonstra o desejo de poder e de singularidade – ser único, ser especial, ser eu mesmo é um desejo comum do ser humano. O desejo de exclusividade que o ego reclama para si caracteriza a separação entre eu e o outro e é característica fundamental da dualidade.
  • A mistura de características humanas e bestiais, masculinas e femininas constitui uma coleção que o diabo foi adquirindo ao longo do caminho. Quando nascemos, vamos adquirindo qualidades que buscamos no meio social a que estamos expostos. Adquirimos uma nacionalidade, um nome de família, um status social, uma cultura, um endereço e uma série de outras características que vamos colecionando ao longo da vida como profissão, estado civil, doença, deficiência, títulos e chamamos todo esse conjunto de eu.  Quando somos chamados a falar sobre nós mesmos, desfilamos todas essas informações que costumam formar um cadastro de identificação. Essa bagagem que adicionamos sobre nós mesmos é como uma série de artificialismos com os quais nos identificamos e acreditamos ser nossa natureza original. A ignorância de não saber quem verdadeiramente se é e o apego a todos estes adereços nos faz parecer com a figura central do arcano XV.

A ORIGEM DO MAL

“… mas Deus disse: ‘Não comam do fruto da árvore que está no meio do jardim, nem toquem nele; do contrário vocês morrerão”.      Gênesis 3:3  

O livre arbítrio é a liberdade de escolher. Quando existe apenas uma opção, não há realmente uma escolha a ser feita, então fazer a coisa certa não é uma escolha responsável e madura, é apenas falta de opção. Falta de liberdade é escravidão. Quando Deus possibilitou a Adão e a Eva obedecer ou desobedecer a sua ordem de não comer do fruto da árvore do conhecimento do bem e do mal, ele deu a eles liberdade de escolha, facultou que tomassem suas próprias decisões e arcassem com as consequências de seus atos.

Da mesma forma que Adão e Eva eram livres para escolher, Lúcifer também era. Deus criou Lúcifer como um anjo de luz livre para harmonizar-se ou não com as leis do universo. Lúcifer escolheu  fazer diferente e o mal surgiu como uma consequência natural, como uma inversão dos fluxos de energia do universo. Assim, por uma reação em cadeia, lentamente a justiça tornou-se injustiça, a verdade tornou-se mentira, a saúde tornou-se doença, a alegria tornou-se tristeza, a coragem tornou-se covardia, a luz tornou-se trevas, o amor tornou-se ódio e a vida tornou-se morte. Essas metáforas buscam explicar a criação do mal como consequência da desarmonia com as leis do amor e do universo.

“O mal do nosso tempo é termos perdido a consciência do mal.” Krishnamurti

                                                                 

COMO REVERTER O MAL EM BEM ?

Como fazer o movimento reverso e desfazer o malfeito?

Quando lutamos contra alguma coisa, exercemos uma força que entra em choque e gera conflito.  O conflito fortalece o mal. Lutar contra o mal, se negando a vê-lo dentro de nós, mantém-nos cegos para aquilo que precisa ser mudado. Se o mal se esconde nas trevas, então olhar para ele é como ligar a luz do quarto da bagunça para começar a limpar, organizar e colocar tudo no seu devido lugar.

O Diabo faz a verdade parecer mentira e a mentira parecer verdade. A distorção da verdade em mentira é um dos princípios do mal. Assim sendo, a reversão do mal em bem pode começar pela busca da verdade.  Olhar de maneira honesta para si mesmo, com o desejo sincero de ver o mau que há internamente, sem medo de ser punido, nem orgulho de querer estar acima das imperfeições humanas faz parte do trabalho de diminuir o poder da mentira por meio da luz da verdade. Enunciar os próprios sentimentos, dar nome às próprias intenções negativas ajuda a levar a luz da consciência para iluminar a escuridão.

Culpar os outros pelos nossos problemas é outra característica do mal. Então, assumir a responsabilidade saudável pelo próprio desenvolvimento pessoal e pelas experiências dolorosas que atraímos para a nossa vida, possibilita que haja uma transformação da consciência e energia correspondente, o que já é por si só, um processo de cura.

“… a linha que divide o bem do mal atravessa o coração de todo ser humano. E quem se disporia a destruir uma parte do próprio coração?”

                                                        Alexander Solzhenitsyn

O Diabo representa A PERSONIFICAÇÃO DO MAL em suas muitas expressões.

O mal é uma distorção da energia do bem, por isso carrega poder, vida e prazer e não pode ser destruído, apenas revertido em sua unidade original. 

“Se trancarmos nossa sombra em uma caverna, ela se torna ainda mais sombria. Só quando temos a coragem de libertar a sombra é que o sol pode tocá-la… e então tudo vira luz.” Patrícia Gebrim

Dentro de cada demônio existe um anjo de luz confinado a espera de ser libertado. A luz dA Estrela, que um dia era livre e bela, está aprisionada por baixo das trevas distorcidas da dualidade do bem e do mal. Lapidar essa autocriação deformada requer coragem e determinação.

O mal encerra em si mesmo o remédio que o transforma de volta em bem. A partir deste mecanismo natural, a verdade trabalhará para transformar o medo em fé, a mentira em verdade, a ignorância em sabedoria, a carência em abundância, a separação em união e o ódio em amor.

O arcano XV, O Diabo surge para ser encarado honestamente.

Mensagem

A parcela de mal no interior de uma pessoa abre um canal de acesso que permite que o mal que existe no ambiente e nos outros influencie o estado emocional e o comportamento dela. Assim, a negatividade interior e a exterior alimentam uma a outra num círculo vicioso que precisa ser interrompido por meio do questionamento honesto das crenças e conclusões equivocadas que distorcem a verdade e sustentam a separação e a mentira.

Conselho

Seja honesto e busque a verdade.

Palavras-chave

O mal, o governo oculto do mundo, o medo do desconhecido, a culpa, o orgulho, a separação, a mentira, a crueldade, criar intrigas, a injustiça, os vícios, o ódio, a vingança, as guerras, o ciúme, a falta de amor próprio, o abandono, a autossabotagem, a ignorância, a rejeição, a traição, o julgamento, a cobiça, o ressentimento, a inveja, o assassinato, o crime, o rancor etc.